Desde o final do século XX, denuncio a invisibilidade da mulher cuidadora. Atualmente, citaria homens que quebram paradigmas, parte pequena em um universo familiar.
Tenho empatia e identificação com essas mulheres, abandonadas à própria sorte, adoecidas e sem sonhos, todas são parte importante em minha trajetória de mãe adolescente que fui.
Coordenei o Movimento Pró-Vida Assistida (MPVA) durante 7 anos, desejei unir associações representativas. Observava que havia associações antagônicas, quando o objetivo era comum: apoiar seus filhos com deficiências.
O MPVA lutou pela regulamentação de Residências Terapêuticas, pelo cuidado a quem cuida, fizemos eventos, na tentativa de acolher, dar suporte e partilhar nossas dificuldades, lutar pelos nossos direitos ao cuidado e à visibilidade da mãe, permanente cuidadora. A área pública só tinha olhares para os transtornos mentais, as síndromes eram “secundárias”.
Tudo e tanto a fazer!
Agregar permanentemente tantos familiares exaustos e ocupados em manter a economia do lar – são muitas as despesas, os investimentos, muitos a fundo perdido. Cadê o tempo para atuar nessa luta?
Familiares que participaram do MPVA se dedicavam à sobrevivência de seu grupo familiar. Os encontros passaram a ser mais raros, demonstrando a falta de tempo e energia para pensar no próprio futuro e em como enfrentá-lo. Não se vislumbrava tantas soluções.
Foi por isso que entreguei toda toda a documentação que possuía à pesquisadora, Dra. Helena Fiez, e o MPVA foi encerrado. Era 2015, momento delicado no país.
Enquanto o mundo penetrava na era veloz da informática, a vida dessas mães permanecia a mesma entre atendimentos e justificativas nas faltas ao trabalho, causas de demissão e ausência de suporte familiar.
Um cuidado também on-line
Tive muitas experiências negativas em atendimentos – públicos ou particulares – e raros foram os profissionais que olharam para mim com empatia, que me acolheram e me possibilitaram caminhos. Revi minha rota e a convite de associações e da Fundação de Articulação e Desenvolvimento de Políticas Públicas para PcD e PcAH no RS – fiz palestras, lives, conversei com familiares e profissionais sobre a importância de apoiar essas famílias em seu cotidiano estressante. Durante a pandemia, criei atendimento on-line – Arteterapia para cuidar de mães. Veja os vídeos de seus depoimentos. Grupos online são válidos e auxiliam muito.
A importância do casal
Pouco se fala em acolher um casal, que precisa encontrar tempo para manter viva a chama de seu amor. O espaço para um casal inclui distribuir tarefas domésticas, cuidar com as sobrecargas.
Fico um pouco animada ao perceber que há pais que assumem suas crianças atípicas e exercem a maternagem. As crianças se desenvolvem muito mais quando ambos se dedicam, sentem-se mais seguras.
Assumirem juntos o cuidado de filho atípico é fundamental. Mas iremos esbarrar em questões sociais e econômicas. Como cuidar de homens em carregam a cultura machista: não podem chorar, não podem cuidar de suas dores emocionais? Como esperar que ele se torne emocionalmente forte para dar conta sen adoecer também? Negar a dor não faz bem.
Reduzir a sobrecarga de quem cuida é urgente.
A importância da Comunidade
Parabenizo a equipe do INEP pela escolha do tema para a redação do ENEM: a invisibilidade dos cuidadores familiares: “Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”. O assunto falado pela sociedade amplia sua observação em relação a essas cuidadoras.
A comunidade pode ajudar, assim como a família pode e deve colaborar: avós, irmãos, tios… O pouco que cada um possa fazer já auxilia esses pais, que precisam cuidar de si mesmos, viverem, ampliarem seu repertório de alegrias para darem conta de tantas demandas. Além disso, o cuidado compartilhado com a sociedade traz benefícios enormes para as crianças.
Como eu previ há décadas, a rede de saúde não ofereceria residenciais terapêuticos gratuitos, mas a pessoas abandonadas, com famílias precárias, muitos egressos de hospitais psiquiátricos.
No Brasil, após a lei de desmanicomialização, vêm sendo criados Residenciais Terapêuticos, lugares com cuidado mais adequado, mas os pais esbarram nos custos. Quem pode bancar tantas despesas?
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