Quando meu filho era pequeno, não havia lei que obrigasse a escola a acolher a sua matrícula. Havia profissionais que conheciam algumas escolas e certos professores. Havia o Serviço de Orientação Educacional, que dava suporte à professora e acolhia na sua sala, reduzindo o estresse da professora e dando suporte à criança.

Meu filho sofria bullying, não conseguia acompanhar o ritmo escolar. A professora o retirava da sala e ele ia para o SOE, onde havia quem o apoiava, ajudava a compreender o ocorrido, dava limites e suporte nas atividades. Com apoio permanente em casa e ali, ele terminou o primeiro grau.

Pouco se falava em inclusão naquele tempo da década de 80-90. Protegê-lo dos lobos sociais era tarefa familiar permanente. O medo me cercava a cada vez que ele saia de casa.

O valor do abraço

Há tempos escrevo sobre o valor do abraço e do “não-abraço”, o que resultou em material publicado em uma revista de Arteterapia e em um capítulo de livro também de Arteterapia. No livro, que traz a resistência de uma família com um de seus membros atípicos e de que modo se manteve, o afeto é o contraponto permanente.

O livro “Como controlar os lobos!” traz esse sentimento de cuidado intensivo e exaustão, sempre com proteção para evitar o pior. Meu filho ser atirado aos lobos foi uma tônica em nossa vida e protegê-lo exigiu de mim uma energia hercúlea, que recebi de raiz familiar. Mas foi fundamental o colo de amigos e de meu companheiro de então, cujo abraço recolhia minha história e o meu choro, e me continha em seu calor. Então eu me sentia protegida.

Como surgiu o livro

Como controlar os lobos?” feito em 3 horas contínuas à caneta. protelei a viagem para retornar do Congresso Psicologia e Projeto no RJ para escrever sobre o que me afogava e dar o meu recado que pedia gritos.

A adolescência de uma pessoa vulnerável mentalmente me parece ser próxima do racismo. A rejeição à cor se aproxima da rejeição aos demais singulares. Estávamos em 2000. Novo século e o que isso nos dizia? Da distopia que viria? A internet a espalhar informações e a tirar a importância dos professores e pais na educação familiar e escolar. Afinal, tudo iria para a internet… Um risco que eu, professora universitária, percebia com clareza. E, enquanto isso, a mudança nos hospitais psiquiátricos seguia e as redes de CAPS tinham início aqui e ali. Muito a fazer.

Enquanto isso, quem ouviria os gritos de uma mãe? Sim, novamente, o papel e a caneta recolhiam a minha aflição, já acolhida há décadas com poesias, diários, cartas a amigos, contos.

Em Porto Alegre

Ao chegar ao RS, não consegui mais ler os escritos, sentia que não suportaria o meu cotidiano e o relato juntos. Comentei com Maria de Lourdes Vernet Machado e o escritor Orual Machado da minha dificuldade e eles, amorosos e acolhedores, se dispuseram a copiar os manuscritos feitos de um fôlego e foi então que o qual encaminhei ao escritor e crítico literário Antonio Holfeldt, que abriu a porta que eu precisava.

Elaborado com recursos de escrita literária que eu aprendera em Oficinas de criatividade, o livro foi publicado.

Um tempo de mudanças

Era um tempo de desmanicomialização e as questões de transtorno mental eram evidentes na sociedade e em encontros de saúde mental. O autismo não tinha CID como hoje e a voz da mãe era desconsiderada. E eu sentia meu adoecimento e exaustão.

Uma adolescência tardia e as necessidades de meu filho cuidado se tornaram mais complexas. Por muito pouco não o perdi em cada uma das várias tentativas de sucídio, suspensas quando a sua compreensão deu conta de aceitar que seus medicamentos lhe davam equilíbrio e o faziam sentir-se melhor. Isso encerrou o seu ciclo de internação psiquiátrica.

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A questão da inclusão ainda me causa dúvidas – isso comentarei em outro post. Encontrará algumas situações que vivenciei com meu filho com deficiências em escolas públicas em Porto Alegre neste livro. CLIQUE AQUI. Quem desejar adquirir este livro, TIRE SUAS DÚVIDAS NO CONTATO aqui.

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Marilice Costi é escritora, poeta, contista. Especialista em Arteterapia e Capacitada em Neuropsicologia da Arte, é graduada em Arquitetura e mestre em Arquitetura pela UFRGS. Publicações: livros e artigos. Foi editora da revista O Cuidador.
 
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