Quando me incomodo, escrevo. Dias atrás, li um texto no Linckedin que tratava da questão do autor e seu ego. Este texto nasceu por isso. Talvez meus melhores livros sejam o resultado de uma incomodação, uma percepção, uma dor que precisa lugar para ir. E depois, minha escrita é muito trabalhada, retrabalhada até encontrar o “ponto de bala”.
Será mesmo que é para o próprio ego que um escritor trabalha? Ou ele escreve para que o mercado venda? Ou porque precisa escrever e não se sentiria bem se essa necessidade de se expressar não tivesse vazão?
Há de tudo por aí. Desde autores que descobrem um modelo e se repetem, aqueles que escrevem um livro inovador, questionador, instigante, que faz ampliar nosso olhar no mundo, até aqueles que escrevem uma vez e nunca mais.
Dizer que o escritor escreve para o próprio ego, não me agrada. Escrever tem relação com estímulos que se têm para criar uma obra, sentimentos que envolvem o start do processo de criativo, trabalho, trabalho e trabalho: a palavra certa, a necessária clareza, o fluxo que nos estimula a continuar lendo, as revisões, muita dedicação, autocrítica e tempo.
Um bom escritor não está preocupado com o mercado, está preocupado com a qualidade do seu trabalho, com o seu legado. Se o autor estiver na mídia, vai facilitar muito, terá visibilidade, vai vender, mas terá que manter qualidade nos próximos livros. Um bom escritor nem sempre é reconhecido. Recentemente uma escritora com trajetória importante comentou comigo sobre a qualidade discutível que o mercado está oferecendo, o quanto lastimava a quantidade com baixa qualidade. Há muitas opiniões. O direito de qualquer pessoa publicar seu livro também existe.
O mercado vende o que foi descoberto pelo leitor, o que os algoritmos fizeram… um bom título, a capa especial, um texto que segura o leitor… são muitas coisas que podem interferir na venda e independem do escritor.
Os autores dos clássicos não passaram por este questionamento. Muitos eram cobrados pelos seus prazos. Seus textos eram compartilhados com seus editores, que mandavam cortar, mudar trechos ou páginas, com o objetivo de deixar o produto de acordo com o que eles venderiam. Autores que insistiram com seu trabalho mudaram a vida de muitas pessoas. As mulheres, por exemplo, escritoras que tiveram que se passar por homens, as que inovaram a literatura e tantas brasileiras. Vejam aqui.
Para uma obra ser considerada universal, há que ter humanidade, livro que ultrapassa o tempo e o espaço, os aspectos psicológicos são importantes. Os personagens não serão perfeitos, nem apenas maldosos, o ser humano tem luz e sombra. Resultam da empatia do escritor com o universo de seus personagens. Muitas vezes nos deixam com o sabor de quero mais. Será o livro que guardamos com carinho, deixou marcas em nós.
Penso que, neste momento, não estamos na mão de editores, estamos na mão de outros. Precisamos satisfazer o desejo dos outros. E muitos desses outros não estão interessados em adquirir sabedoria, melhorar sua capacidade de pensar e de compreender a vida e a sociedade. Não buscam o desafio de prazer uma obra com qualidade literária, nem sempre fácil de ler. Querem o imediato, o prazer imediato.
Uma obra de verdade traz isso e muito mais que isso.
MARILICE COSTI escreve desde menina, é Prêmio Açorianos 2006 pelo livro Ressurgimento, editou durante 7 anos a revista O Cuidador, finalista em mídias impressas no Prêmio Brasil Criativo 2016, São Paulo. Arteterapeuta Esp. e Arquiteta MSc. Tem diversas publicações.